“Chamo-lhe amor para simplificar. Há palavras assim, que se dizem como calmantes. Palavras usadas em série para nos impedir de pensar. O que existia, existe, entre nós, é uma ciência do desaparecimento. Comecei a desaparecer no dia em que os meus olhos se afundaram nos teus. Agora que os teus olhos se fecharam sei que não voltarás a devolver-me os meus.”
Em recente entrevista, a autora
portuguesa Inês Pedrosa contou: “Escrevo a partir do que não sei – porque é isso o que me importa: o
que fica a latejar para lá do que julgamos saber. O que dói. O que se sente
intensamente. O que não para numa resposta.” E nada pode exemplificar tão bem os sentimentos tão doloridos presentes em Fazes-me falta, do que as palavras da sua própria criadora. Sentimentos provocados, ao mesmo tempo, pela ausência e presença daquilo - e daquele - que já se foi, mas de alguma forma ainda
insiste em permanecer em nós.
Fazes-me falta é único até em sua
composição narrativa. Duas vozes. Duas pessoas. Um homem e uma mulher, intercalando-se
entre monólogos cheios daquilo que ficou por dizer. Incontáveis sentimentos
compartilhados entre essas duas almas tão distintas e tão semelhantes. Mais
ainda, tão incapazes de separarem-se mesmo diante de algo irreversível como a
morte.
“Preciso de me despedir de ti, ou de aceitar a morte, que é a mesma coisa.”
A história começa a ser contada
pela voz da mulher. Uma jovem mulher que desde o começo descobrimos estar morta.
A partir deste início somos então conduzidos por entre memórias, por entre
momentos, por entre sentimentos, por entre amor, por entre amizade. Por tudo e
por nada. Pela relação tão indefinível e, mesmo assim, sem necessidade de
definição entre duas pessoas que, mais do que tudo, amaram-se e conheceram-se
mais do que a quaisquer outras. Onde um está presente no outro, seja na vida ou
na morte, ou seja na ausência tão cheia da presença do que já não está mais lá.
De quem já não está lá, mas ainda insiste em permanecer. “Fiquei em ti mas deixaste de precisar de mim, e por isso precisei ainda
mais de ti.”
“Demasiado tarde. São estas as palavras mais tristes de qualquer língua.” E ainda mais triste é saber que é demasiado tarde para dizer tudo aquilo que não foi dito, porque se pensava ter todo o tempo do mundo, mesmo conhecendo a mentira por trás dessa afirmação. “A única substância incompreensível é a mortalidade, que só o ser humano conhece.”
“O que importa não é o enredo, a forma, nem sequer a cor. O que importa é a circulação conjunta de um corpo e de uma alma em torno do despojado sedimento da sua verdade.”
Paradoxal. Visceral. Procuro por palavras que possam definir uma ínfima parte do que foi Fazes-me falta para mim, mas não consigo defini-lo. Percebo que não encontrarei definição, porque não se define o que se sente. Apenas sente-se. E cada um de nós sentimos de uma maneira. Vi-me nas palavras de Inês Pedrosa, me vi perdida nas Curvas do Tempo, perdida no nada, na névoa, incorpórea e ainda assim tão real. Tão, e cada vez mais, humana com as dores a latejar a despeito da falta do corpo.
“Usei-te eu como devia? Porque me sobras tanto, ainda?”
Que linda sua resenha, Taci!
ResponderExcluirHá mesmo coisas que não se pode traduzir em palavras. Esse livro já tinha sido muito bem recomendado, agora então... quero ler para ontem!
Aliás, essa era uma das minhas opções para este mês do DL2013. Estamos em sincronia total, hein?
Beijo
Obrigada, Mi!
ExcluirÉ um livro incrível, vale a pena por cada palavra! Sincronia total mesmo, acabamos lendo "a máquina..." do Hugo Mãe ao mesmo tempo também.
Bjos =)